quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

UNS NO CAMPO, OUTROS NA PRAIA


"Na primeira (parte), pela equipa caseira, jogou o Estoril que ganhava por 1-0. Na segunda, jogou o Praia que perdeu por 0-3.

Benfica sempre a melhorar
Grande jogo do campeonato em Paços de Ferreira. Emoção, luta intensa, incerteza no resultado, mudanças tácticas, boas exibições individuais e dois colectivos cada qual com o seu propósito, mas ambos incisivos. Depois de meia-hora de um Benfica cinzento e um Paços atrevido, a última ora da partida só deu Benfica. Sobretudo, uma segunda parte fulgurante de querer, insistir e resolver. Ou citando José Manuel Delgado em A Bola, «espírito de conjunto, primado do colectivo e uma fé de grupo que move montanhas». Escrevi a semana passada que os jogos mais difíceis até ao fim são os que se irão jogar com as equipas em risco de despromoção. Este jogo veio evidenciá-lo meridianamente.
Desta vez - e para desgosto de falta de matéria-prima - não houve casos flagrantes para discussão arbitral. Ainda bem. O Benfica continua a não depender de si próprio para ser pentacampeão e as jornadas vão diminuindo, mas mantém-se focado nesse objectivo jogando agora claramente melhor do que há meses. Ao fim de 24 jornadas, o Benfica tem apenas um ponto a menos do que no tetracampeonato, apesar de, objectivamente, ter uma equipa menos forte do que então. Curioso é ver o desempenho ao longo das jornadas: no primeiro terço: 5V, 1D (Boavista), 2E (Rio Ave e Marítimo), 7 pontos perdidos (29%), 16-6 em golos; no segundo terço, 6V, 0D, 2E (Porto e Sporting), 4 pontos desperdiçados (17%), 22-5 no score global; finalmente, no último terço: 7V, 0D, 1E (Belenenses), 2 pontos perdidos (8%), 24-5 em golos.
Neste jogo, provou-se a importância de dois suplentes que considero bons jogadores: Raúl Jiménez e Haris Seferovic. Percebe-se que, no actual modelo de jogo de Rui Vitória e tendo em conta a imprescindibilidade do notável jogador que é Jonas, não tenham tantas oportunidades como seria justo. Mas Jiménez dá velocidade e capacidade de luta ao ataque e o suíço evidencia um aspecto que eu muito aprecio: a simplicidade de processos. A assistência para o golo decisivo de Jonas é disso um bom exemplo.
Um apontamento ainda para Rafa. Lá está, não há nada como jogar com regularidade. É assim que Cervi se vem impondo, que Zivkovic vem evidenciando que é um craque e que agora Rafa já mostra mais confiança a juntar à classe que ele tem dentro de si. Fez um belíssimo jogo e bem mereceu, finalmente, em termos de golos passar do quase para o finalmente.
A propósito de Jonas, um jovem de 33 anos e, na minha opinião, o jogador mais completo do campeonato, pena tenho que, por causa do menor ranking dos clubes portugueses na Europa, não tenha plenas condições para se sagrar 'Bota de Ouro'. Os golos em Portugal passaram a ter um coeficiente de 1,5 em vez de 2, pelo que os 27 golos marcados por Jonas em 24 jornadas - bem à frente dos goleadores nos principais campeonatos - valem 40,5 em vez de 54 pontos.

O penálti
Ainda a propósito de Jonas, surpreendentemente, veio a falhar, na penúltima jornada, o terceiro penálti dos últimos quatro assinalados (Rio Ave, na Taça; Belenenses e Boavista). Mesmo assim, a sua conta é altamente positiva e espero que continue a marcá-los. Estes falhanços (todos, defesas dos guarda-redes) lembraram-me um texto que na minha anterior coluna em A Bola ('Pontapé de Saída') escrevi, já lá vão 4 anos e que intitulei «A estatística de penalidade». Permito-me aqui voltar a esse texto, precisamente por causa de Jonas.
Uma baliza mede 7,32 m por 2,44 m. Ou seja, a largura é o triplo da altura. Segundo um estudo  do site Globoesporte, dividindo o espaço em 9 áreas iguais, verificamos que o lado direito da baliza é o preferido dos chutos. Nada menos que 46,3%. Por outro lado, se dividirmos o espaço da baliza em três zonas de baixo para cima, o terço junto da relva abrange 45,1% dos remates, e o terço mais alto até à barra é alcançado por 22,9% dos tiros. em resumo, as preferências são assim ordenadas:
4.º  -  7.º  -  9.º
3.º  -  6.º  -  5.º
1.º  -  8.º  -  2.º

Sobre a eficácia na marcação dos penáltis, todos os remates para o terço superior do lado esquerdo são infalíveis, mas só 4,6% por lá passam, a parte directa da baliza no terço a partir da relva é onde se concentram mais tentativas (21%), mas a mais falível, onde só 2 em cada 3 remates entram. Em esquema:

4.º  -  8.º  -  1.º
2.º  -  6.º  -  7.º
9.º  -  5.º  -  3.º

Parece haver, pois, uma interessante correlação entre grau de dificuldade/escolha/eficácia.
É claro que esta estatística não considera os remates tipo rêguebi, ou para os postes ou que saem ao lado. Nem nada nos diz sobre a potência do remate. Ou quando o guarda-redes se mexe ou adianta irregularmente. Nem sobre se o marcador é destro ou canhoto. Nem sobre as paradinhas.
Ora, voltando a Jonas, os três penáltis falhados foram junto à relva e dois deles para o canto inferior direito que é, precisamente, onde se falha mais.
Cá para mim, o chuto deve ser sempre:
a) forte;
b) a meia-altura.
Mesmo que o guarda-redes adivinhe o lado chega sempre depois de a bola entrar.

Estoril na praia
No jogo Estoril Praia - FC Porto houve duas partes abusivamente separadas por largas semanas. Na primeira, pela equipa caseira, jogou o Estoril que ganhava por 1-0. Na segunda, jogou o Praia que perdeu por 0-3. Como se isso não bastasse e para que tudo ficasse mais de acordo com o desejado nos primeiros minutos, o VAR resolveu validar um golo absolutamente ilegal aos portistas.
Quanto ao primeiro aspecto, não sei que benzodiazepina tomaram os jogadores do Praia. Sonolentos, apáticos, só lhes faltou a toalha de banho. Nunca vi coisa igual. Aliás, foi de tal modo escandaloso que o técnico estorilista Ivo Vieira não se coibiu de, publicamente, criticar asperamente a sua equipa. Diz-se que o Porto foi fulgurante nesta segunda metade da partida. Pudera, jogou sozinho... Aliás, o Porto ainda que estando a jogar bem, já se está a habituar a enormes dificuldades face aos seus opositores. Veja-se o caso dos amigáveis Rio Ave e Chaves e do parceiro Portimonense...
Quanto ao segundo ponto, o VAR foi nada mais nada menos do que o advogado Luís Ferreira, que às vezes confundo com Fábio Veríssimo na estampa e nos tiques. Para memória futura: Luís Ferreira também foi o VAR no Porto - Belenenses num jogo em que, por coincidência se juntou o VAR Ferreira e o árbitro Veríssimo (lembram-se de dois penáltis descarados perdoados ao Porto quando havia 0-0?) e foi o árbitro que esteve na origem dos golos do Boavista quando na época passada os axadrezados chegaram num ápice aos três golos. Se juntarmos João Capela (ora poliglota entendendo a língua de Camões com a língua de Cervantes no seu mentiroso relatório do interminável Tondela - SCP), assim se forma o actual grande trio internacional da arbitragem portuguesa.

Contraluz
- Certeza: João Félix
Trata-se de um jogador com larguíssimo futuro. Ainda júnior, embora actuando muitas vezes já no Benfica B, o meu homónimo de apelido marcou dois golos soberbos na vitória fora de casa contra o FC Porto qe garantiram a vitória neste jogo da fase final para apurar o campeão nacional sub-19.
- Imprevisibilidade: Taça de Inglaterra
O quase imbatível e multimilionário Manchester City de Pepe Guardiola, foi eliminado da competição por um clube da terceira divisão inglesa, o Wigan. Na Inglaterra qualquer jogo é emocionante e de desfecho não assegurado, já o mesmo acontecera ao Arsenal ao ser superado pelo Nottingham Forest, do 2.º escalão.
-Acontecimento: Olimpíadas de Inverno
Acabaram estes jogos realizados na Coreia do Sul que pude acompanhar pela Eurosport e pelos excelentes resumos da RTP2. Menos afamados que os de Verão, não deixam de ser uma realização belíssima e de grande qualidade competitiva.
- Acordo: Entre SLB e Jorge Jesus
Um fim do litígio inteligente e oportuno entre o tetracampeão Benfica e o bicampeão Jesus."

Bagão Félix, in A Bola

UM AZAR DO KRALJ


A carta de amor ao Benfica (...)j: “Nós só cá estamos para cuidar de ti até à geração seguinte”
"Meu querido Benfica,
Muitos parabéns. 114 aninhos e continuas tão bonito como no dia em que todos, sei lá quantos milhões, nos apaixonámos por ti. Já te disse isto antes, mas hoje é dia de festa redobrada lá em casa. O Tomás e o Sebastião cantaram os parabéns à avó Guta e a ti. A seguir perguntaram-me se o Jonas jogava hoje. Não lhe dei o presente que eles pediram mas o aniversário não é deles. Terão uma vida inteira para perceber. Além disso, compensamos já no fim-de-semana contra o Marítimo.
Escrevo estas coisas um nadinha comovido porque é tudo verdade. O Benfica e a minha mãe fazem anos no mesmo dia. Gostava de escrever algo que superlativasse devidamente esta coincidência, e vou tentar com muita força nos parágrafos seguintes, mas já sei que estou condenado ao falhanço. Podia ser só isso, mas ninguém ia aceitar um texto com tão poucos caracteres na Tribuna e o meu amor por ti não se fica por aí.
Os meus filhos já reagem instintivamente ao Benfica. Há um lado do seu pai que, imbuído de uma pedagogia discutível, apela ao pluralismo cromático e aplaude quando os vê escolher o azul ou o verde em questões menores da vida como a cor de céu favorita - azul ganha ao cinzento - ou a cor que define um jardim - é o verde. Porém, quando o futebol lhes entra pelos olhos adentro, há já uma tentativa de verbalizar, uma atenção consciente, há, direi até, uma recepção dirigida rumo à baliza. Mas há mais. Imagina tu, meu querido Benfica, que o destino decidiu oferecer-me uma esposa que tem uma fotografia sua a receber a medalha de 25 anos de sócia ao lado do Ricardo Araújo Pereira, uma das pessoas a quem eu mais tentei agradar desde que decidi escrever um parágrafo que fosse. Eu não sou de hashtags, mas porra. Se tudo isto não é caso para dizer #blessed, não sei o que será.
Já percebeste. A vida é maravilhosa para um tetracampeão, mesmo que chova no teu dia de aniversário. Que se dane. Não seria a primeira vez que celebrávamos juntos à chuva. Como dizem os indefectíveis adeptos organizados que te levam para todo o lado e fazem este activista de sofá sentir-se devidamente representado, mas também privilegiado por ser do clube que é: Seja. Onde. For.
Eu podia dizer que não me lembrava, mas estaria a mentir. 23 de Maio de 1990, por volta das 16:45. Turmas inteiras numa escola primária de Linda-a-Velha eram mandadas mais cedo para casa. Celebrámos todos, independentemente da cor clubística. Foi bonita a festa. Ruy Belo escreveu que “a eternidade é não haver papéis”. Para uma criança de 8 anos, a eternidade era não haver aulas e Portugal ficava em frente à tv. Ainda hoje me lembro da perplexidade com que percebi que um clube de futebol tinha alterado o dia de toda a gente. O Benfica jogava contra o Milan. Repito: foi bonita a festa. Perdemos o jogo. Ganhou-se um benfiquista. Nunca mais fui igual.
Muita coisa aconteceu desde então. Vê lá tu que me fizeram sócio do Belenenses e eu gostei tanto do Mapuata, do Jaime, do Galo, do Saavedra e das boleias infindáveis do pai Mirra que que ainda hoje me lembro de equipas inteiras que vi jogar no Restelo. Fui uma espécie de polígamo. Era miúdo. Felizmente soubeste aceitar-me, tu e o meu pai que terá visto ali um devaneio da adolescência. Souberam aceitar-me como eu era e nunca mais olhámos para trás.
Hoje, não poderia viver mais confortável na minha pele. Hoje, muitos anos depois de descobrir que seria do Benfica para sempre, percebo que o amor a um clube de futebol não é assim tão diferente do que acontece quando nos apaixonamos por outro ser humano. É uma foleirice. É um bocadinho sofrido. Sobrevive-nos através das pessoas que cá ficam e continuam. É uma abstracção mas tem morada, é um porto de abrigo, um ombro em quem encostar a cabeça ali na Av. Eusébio da Silva Ferreira. É, como diria o meu herói MEC, fodido.
É de loucos. Um dia damos por ti e queremos correr e dizer a toda a gente. Fazemos e dizemos coisas pouco racionais. Irritamo-nos com tudo e beijamos o símbolo da camisola, tudo porque amamos. Ou apenas, porque nem sempre parece suficiente. Olha, meu querido Benfica, só sei que um dia dei por ti e nunca mais te larguei.
Os dirigentes e adeptos de um certo belicismo clubístico que me desculpem, mas nós só cá estamos para cuidar do Benfica até à geração seguinte. Além disso, não é esse o amor que eu tenciono pregar no dia de anos do Benfica e da minha mãe. Ambos me ensinaram que há outro caminho.
E é justamente por isso que, quando algumas pessoas de outros clubes dizem que eu escrevo aquilo que escrevo porque sou um avençado ou um cartilheiro, o meu coração balança entre responder com o mais aguerrido dos insultos ou simplesmente retribuir com mais amor - neste caso, ao que é de hoje e sempre. E escrevo estas coisas um nadinha comovido porque é tudo verdade - o meu amor por ti. Parabéns, meu querido Benfica."

RESULTADOS 1º SEMESTRE 17/2018 :: ESPECIAL BTV :: 28 FEVEREIRO 2018

                                           

BENFICA SAD COM LUCRO DE 19,1 MILHÕES DE EUROS NO PRIMEIRO SEMESTRE
CLUBE
A redução do passivo em 53 milhões de euros é outro ponto relevante dos resultados apresentados no dia em que o Clube comemora 114 anos de vida.
O Sport Lisboa e Benfica – Futebol SAD apresentou um resultado líquido positivo de 19,1 milhões de euros (M€) no primeiro semestre do exercício 2017/18.
Este número, comunicado à CMVM e divulgado no dia em que o Clube comemora 114 anos de vida, traduz um expressivo crescimento de 634,1% em relação ao resultado positivo (2,6 M€) apurado no período homólogo de 2016/17, mantendo-se a tendência de performance positiva iniciada no final do exercício de 2013/14.
Numa linha de crescimento, o total de rendimentos da Benfica SAD evoluiu para 111,6 M€, mais 25,6% face ao registado no primeiro semestre de 2016/17. Já o capital próprio positivo de 87,6 M€, além de cumprir o estipulado no artigo 35.º do Código das Sociedades Comerciais, representa uma melhoria que se situa nos 19,9 M€.
Ponto importante desta apresentação de resultados é o que diz respeito à diminuição da dívida bancária (encolheu em 7%) e do passivo (reduziu em 53 M€).
Numa análise global dos resultados nos períodos homólogos, identifica-se um ativo de 473 M€, com uma redução de 33,1 M€ que assenta basicamente nos valores de três rubricas:
Ativos intangíveis – diminuição justificada pelas alienações realizadas e pelo menor investimento em aquisições de jogadores face ao forte investimento realizado no exercício anterior;
Clientes e outros devedores – diminuição devido essencialmente aos recebimentos das vendas de direitos de atletas (Ederson, Lindelof, etc.), compensado parcialmente pelo aumento originado pelas vendas realizadas no 1.º semestre (Nélson Semedo, Mitroglou), o que contribuiu para a redução do passivo;
Caixa e equivalentes de caixa – diminuição diretamente relacionada com a redução do passivo.
Significativa é a evolução no total do passivo, que caiu para os 385,4 M€, baixando 12,1%. O decréscimo em 53 M€ é justificado essencialmente por:
Diminuição da rubrica de fornecedores e credores;
redução da dívida bancária em 7,8 M€ em conformidade com o serviço da dívida contratualizado.
RESUMO DA APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS SEMESTRAIS – ÉPOCA 2017/18
Crescimento do total de rendimentos da Benfica SAD para 111,6 M€ (+25,6% face a 2016/17);
Resultado líquido positivo de 19,1 M€ (+634,1%);
Resultado operacional: 25,6 M€ (+120,2%);
Capital próprio positivo de 87,6 M€ (melhoria de 19,9 M€);
Redução da dívida bancária em 7%;
Redução do passivo em 53M€.
PERSPETIVAS FUTURAS
Conquista do Pentacampeonato;
Integração na Equipa A de jogadores formados no Benfica e continuação da forte aposta no Futebol de Formação;
Reforço da aposta na área de Sports Sciences;
Continuação do processo de expansão internacional do Grupo Benfica;
Reforço da Estratégia Digital;
Cumprimento dos critérios do Fair Play Financeiro;
Redução da dependência face ao Sector Bancário Nacional.

CONTAS FEITAS DUVIDAS DESFEITAS BENFICA TV HD :: 28 FEVEREIRO 2018

                                           

ANÁLISE IMPRENSA DESPORTIVA 114 ANOS DO SL BENFICA 28 FEVEREIRO 2018

                                           

EQUIPAS E ADEPTOS, ADEPTOS E EQUIPAS


"Há quase dois anos, James McIrney, professor de Biologia evolutiva da Universidade de Manchester, respondeu, com dados científicos, à velha questão «quem apareceu primeiro, a galinha ou o ovo?» Para McIrney, as galinhas apareceram muito depois dos ovos...
No futebol, há um dilema semelhante, para cuja solução ainda não apareceu o contributo de qualquer académico: «É a equipa que puxa pelos adeptos ou são os adeptos que puxam pela equipa?»
Vem este introito a propósito das críticas de Jorge Jesus aos adeptos do Sporting que «não souberam ajudar a equipa» no jogo com o Moreirense. Os 38.920 espectadores que demandaram Alvalade na noite chuvosa de passada segunda-feira não ficaram exactamente com a exibição dos leões e, tal como tinha sucedido no final do jogo com o Astana, fizeram-no saber a ponto de provocar a reacção de Jorge Jesus.
O Sporting, à 24.ª jornada, e antes de enfrentar uma dezena de obstáculos de alto grau de dificuldade até ao fim do campeonato, tem o mesmo número de pontos, 59, que contabilizava há dois anos e apenas difere num golo no saldo entre golos marcados e sofridos. Porém, os leões de 2015/16 (grande época) exibiam uma alegria maior ao longo dos 90 minutos, eram mais convincentes e imaginativas e por isso recebiam mais favores dos adeptos, sempre sensíveis à nota artística.
Portanto, e sem querer, nem por sombras, esgotar a matéria dilemática em apreço, arrisco uma resposta: a partir do momento em que o árbitro apita para o início do jogo, são as equipas que puxam pelos adeptos, antes dos adeptos puxarem pelas equipas."

José Manuel Delgado, in A Bola

A BRINCAR COM O FOGO


"Se calhar chegou a altura de olhar com atenção para o fenómeno das tochas e outros objectos pirotécnicos nos estádios do futebol. Esta semana, com a multa de quase 20 mil euros ao Benfica, o assunto volta a ganhar actualidade, mas está longe de ser um exclusivo desta semana, bem como está muito longe de ser um exclusivo dos adeptos do Benfica. É um problema transversal no futebol português e um problema para o qual ninguém aparentemente presta muita atenção.
Muitos destes objectos, lançados a torto e a direito por todos os estádios deste país, são perigosos e podem causar queimaduras graves. Nada gera mais multas para os cofres da Liga - no caso dos três grandes, são centenas milhares de euros por temporada, o que não é pouco. Mas o Regulamento Disciplinar, elaborado e aprovado pelos clubes (parte obviamente interessada na matéria), prevê apenas multas. Elevadas, é certo, mas apenas multas.
A UEFA, por exemplo, não deixa que se brinque muito com o fogo. As multas são bem mais pesadas - começam nas dezenas de milhares de euros - e facilmente um clube é obrigado a jogar à porta fechada caso seja reincidente. O Benfica já sentiu a ameaça na pele e chegou a ter uma pena suspensa, depois de uma tocha lançada pelos seus adeptos ter atingido uma criança num jogo em casa do Atlético Madrid. Antes de cada jogo europeu, as águias alertavam os adeptos para as possíveis consequências do arremesso de materiais pirotécnicos. Parece que nada mudou. Um dia destes, ainda alguém se queima."

terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

O VAR, O ZOOM E O EXCESSO DE REALIDADE


A introdução do VAR é, em si, uma melhoria significativa para o futebol português. Não fora esta inovação, muitas partidas teriam ficado contaminadas por erros de arbitragem irreversíveis. Mas o VAR não está isento de problemas. Por isso mesmo, como bem assinalou Rui Vitória, a utilização do VAR requer bom senso – como é sabido um atributo escassamente utilizado entre nós – e uma revisão do protocolo.
É natural que, estando a Liga portuguesa numa fase experimental de utilização do VAR, o protocolo precise de ser alterado. Afinando falhas evidentes (por exemplo, contrariando alguns incentivos que o árbitro assistente continua a ter para assinalar foras de jogo) e aproveitando o VAR para ajudar a contrariar o antijogo (a partir do momento que há paragens para consulta do VAR deve-se caminhar, também, para, na última fase dos encontros, só contar o tempo efetivo de jogo). Contudo, entre alterações, convém que não seja colocada em causa a função de comando do árbitro de campo, que tem de continuar a ser o ator soberano na aplicação das regras do jogo.

Mas, até ver, o principal problema do VAR é ter transferido do árbitro para o VAR a pressão sobre as arbitragens que se vem transformando no alfa e no ómega do futebol português. A questão é mesmo de contexto: com o VAR passámos a ter um zoom aberto sobre os erros de arbitragens, os que já existiam e os que passaram a ser vislumbrados.
O problema das arbitragens em Portugal continua a ser o mesmo: incompetência de muitos árbitros, cuja permanência na primeira categoria é difícil de compreender, e uma péssima gestão do decorrer dos jogos (lá está, a questão de bom senso). Quem julga que os árbitros favorecem a contra b ou b contra c porque estão corrompidos e que é isso que explica o (in)sucesso competitivo está a atirar ao lado e preso a uma realidade ultrapassada.
O mais significativo, no entanto, é a alteração da forma como percecionamos os casos de arbitragem.
No passado, guardávamos uma experiência fugaz, vivida no estádio ou através dos relatos radiofónicos. Na verdade, ninguém tinha capacidade de garantir se o penalty tinha ficado por marcar. Depois, evoluímos para a repetição ad infinitum do mesmo lance, alimentando horas de conversa improdutiva nas televisões. Hoje, vivemos um admirável mundo novo: cada lance é anatomizado, visto de todos os ângulos possíveis e o movimento é distorcido pelo super slow motion. Com consequências: o número de lances duvidosos por jogo aumentou exponencialmente, para além do razoável, ultrapassando e muito a capacidade humana para os avaliar no momento. Tínhamos os erros grosseiros e agora passámos a ter os erros só visíveis à lupa através dos zooms televisivos, que alimentam o tribalismo e os debates incivilizados. Também aqui talvez fosse bom recorrer ao bom senso e não contribuir para a morte do futebol por excesso de realidade.
Pedro Adão e Silva, in Record

OBREIROS


À semelhança do que sucedeu na primeira gala das Quinas de Ouro, da Federação, na edição de 2018 os jogadores e jogadoras voltam a eleger os melhores onzes, premiando o mérito desportivo nas diferentes posições. O Sindicato promove esta votação que se destaca pelo reconhecimento da qualidade dentro de campo, entre colegas de profissão. A todos os que já votaram e aos que irão ainda fazê-lo, o meu agradecimento pelo contributo para esta iniciativa.
Este tipo de iniciativa recentra o foco no jogador, mobiliza a comunidade desportiva e a sociedade em geral para a valorização do talento, dignificar aqueles que se dedicam à profissão e ao que ela tem de melhor. Premiar o mérito tem o importante simbolismo de centrar a atenção no que de melhor acontece em Portugal, e a gala Quinas de Ouro, personifica essa intenção.

A propósito de mérito e reconhecimento pelos melhores motivos, associa-me à distinção feita a Aurélio Pereira, com a Ordem de Mérito da UEFA, pelo mérito do trabalho desenvolvido na deteção de talentos, aos serviços do Sporting, que permitiu ao futebol português descobrir alguns dos seus maiores nomes. O trabalho de seleção e integração de jovens, através da formação desportiva, é de vital importância e enorme responsabilidade. Hoje começa a merecer maior atenção a visão integral da formação, que permita um apoio efetivo ao desenvolvimento do jovem nas suas diferentes dimensões, pessoal, social, educativa, desportiva e, para alguns, profissional. Os recursos humanos ao nível do recrutamento e integração nas estruturas de formação são fundamentais e, nalguns casos, substituem a ação da própria família no acompanhamento do jovem praticante. Espero que o modelo de certificação de entidades formadoras traga uma aposta generalizada neste modelo.
Joaquim Evangelista, in Record

JONAS SEM IGUAL NO BENFICA HÁ 45 ANOS


FUTEBOL
Desde Eusébio, em 1972/73, que ninguém marcava 27 golos em 24 jornadas do Campeonato…
Com os dois golos marcados frente ao Paços de Ferreira, no último sábado, no Estádio Capital do Móvel, Jonas igualou o registo obtido por Eusébio no Benfica há 45 anos: 27 remates certeiros à passagem da 24.ª jornada do Campeonato Nacional.
São números cada vez mais impressionantes! No Benfica desde a época 2014/15, Jonas estreou-se a fazer o que mais gosta – marcar golos – a 5 de outubro de 2014, frente ao Arouca (4-0), no Estádio da Luz. Desde então tem sido sempre a somar… Superada a marca redonda dos 100 golos, e na quarta temporada no Clube, é já o segundo melhor marcador estrangeiro de sempre do Benfica.

De águia ao peito, o avançado brasileiro assinou 115 golos no total – em todas as provas - até ao momento e, no último sábado, com o bis frente ao Paços de Ferreira, igualou uma marca já com 45 anos.
É que Jonas continua a somar golos e a bater registos históricos!
À passagem da 24.ª jornada da Liga NOS, Jonas tem um impressionante registo de 27 golos, e é preciso recuar até 1972/73 para encontrar o último jogador a consegui-lo com o Manto Sagrado: Eusébio da Silva Ferreira.
Na altura, o Sport Lisboa e Benfica foi Campeão Nacional e o Pantera Negra fechou a prova como o melhor artilheiro, com 40 golos marcados, contribuindo para o total de impressionantes 101 do Glorioso na prova.
Regressando a 2017/18, olhando para a caminhada de Jonas, e fazendo uma perspetiva baseada nos números, basta ao goleador canarinho manter a média para facilmente fechar a Liga com 38 golos apontados…
E existe um outro registo com grandes probabilidades de ser alcançado muito em breve! Com 92 golos no Campeonato de águia ao peito, Jonas está a apenas oito de alcançar o golo 100 na prova!
De Eusébio a Jonas, ou seja, olhando para 45 anos de história, encontramos apenas mais três nomes que se aproximam desta marca ímpar de 27 golos à 24 jornada.
O sueco Mats Magnusson surge com 26 golos, numa temporada de 1989/90 onde assinou 33 no total. Uma década antes (1979/80) Nené é o nome a fixar. O internacional português conseguiu um total de 30 golos, com 25 apontados à 24.ª ronda. A fechar, Rui Jordão, na temporada 1975/76 totalizou 30 golos, contudo, à 24.ª jornada, tinha marcado 24.
TOP 5 À 24.ª JORNADA DA I LIGA
Época Jogador Golos marcados
1972/73 Eusébio 27
2017/18 Jonas 27
1989/90 Magnusson 26
1979/80 Nené 25
1975/76 Rui Jordão 24
Sport Lisboa e Benfica

ANÁLISE DA ATUALIDADE DESPORTIVA SL BENFICA: BENFICA TV 27 FEVEREIRO 2018

                                           

PRIMEIRAS PÁGINAS


segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

JONAS


"O tribunal da Relação do Porto proibiu a divulgação electrónica do universo Benfica. Direi que foi feita justiça.

1. Esta vigésima quarta jornada da Liga NOS disputa-se, uma vez mais, de sexta e segunda. Com a consciência que com a importante presença do Sporting na Liga Europa continuaremos a ter, em regra, jogos à segunda feita ao longo do mês de Março. Que, aliás, arranca já na próxima sexta feita com um determinante derby no Dragão. Futebol Clube do Porto e Sporting medirão, uma vez mais, forças. Haverá perdas de pontos. Mas, antes, um e outro terão de ultrapassar, respectivamente, Portimonense (hoje) e Moreirense (amanhã). O Benfica ganhou, ontem, em Paços de Ferreira. Jogo bem complicado. Renhido. Mas Jonas mostrou, uma vez mais, que é um avançado do outro mundo. Classe pura. Faro único de golo. Excelência. E a unidade da equipa sente-se. É um colectivo vibrante. Que contagia as bancadas. Como aqueles em tons de vermelho que encheram a Mata Real. A forma como todos saltaram, liderados por Luisão, do banco de suplentes para a alegria do relvado, faz-nos acreditar no penta. Jiménez e Seferovic mostraram, uma vez mais, que são úteis. Muito úteis. E, perdoem-me a insistência, Rafa mostra-se, jogo a jogo, a Fernando Santos. Mas de Paços fica mais um jogo com a marca de Jonas. Quase apetece citar Ésquilo - na Grécia antiga - que «os malvados que têm sucesso são insuportáveis»!

2. Ver um jogo do Benfica na Casa do Benfica de Londres é um momento singular e um verdadeiro privilégio. Ao vibrar e degustar recordei, neste concreto tempo e nestas específicas circunstâncias, um livro de um dos mais entusiasmantes escritores portugueses do século XX, Aquilino Ribeiro. Esse livro tem um título longo: «Portugueses das sete partidas (Viajantes , aventureiros, troca-tintas)». É o que continuamos a ser mesmo neste período de uma nova emigração. Naquela casa vibra-se com o Benfica, multiplicam-se os abraços no instante do golo, questiona-se o VAR e, no meio, da Sagres e dos nossos gastronómicos sabores, a alma enche-se de paixão e de fervor, de nostalgia e também de lembranças. Esta emigração, jovem e competente, é a imagem concreta do Portugal europeu e, neste, há qualificação reconhecida, generosidade percebida e disponibilidade permanente. Estes viajantes, diferentes, sentem Portugal e percebem que Mourinho e Cristiano Ronaldo, António Damásio e José Saramago ajudaram e ajudam a evidenciar um outro Portugal. Que os títulos no futebol europeu potenciam e as novas almas do fado ou da música - como Salvador Sobral - multiplicam. Vibram com Portugal e vibram com o clube do seu coração. E nesta pausa de Londres, para além do Fernando e da Carla, do Francisco e do João, partilhei muitos momentos com o Mário e a Irene Vieira. Momentos que não esqueço e instantes que decerto se vão repetir. Cá e lá com a partilha, amiga e serena, do Paulo e da Cristina. Com a certeza que teremos de ir a Manchester ver um jogo do United e de regressar, com a alma imensa que nos acaricia e impulsiona, a esta Casa do Benfica de Londres. Espaço que acolhe todos e que, na sua diversidade, nos faz regressar, ao longo dos largos minutos de um jogo, às místicas de que também o nosso Aquilino Ribeiro nos dá nota naquele livro que merece uma leitura atenta e cuidada. E a fotografia nesta página é, tão só, a recordação de um instante. Uma memória de largos minutos. Já que a memória é o essencial. Da vida. Desta vida! Com a consciência desde Cícero (século II A.C.) que «onde se está bem, aí é a pátria»! É mesmo!

3. A situação de Rúben Semedo é bem complexa. Desde a passada quinta feita que está, em Espanha, em prisão preventiva. E o seu clube, o Villareal, anunciou a suspensão do salário do jovem e promissor jogador português e, logo, a suspensão do inerente contrato de trabalho desportivo. Permitem-me duas notas acerca deste caso. A primeira para evidenciar que, neste mundo de chorudos negócios e interessantes remunerações, parece não haver cautelas proactivas - ou, se quisermos, mecanismos preventivos - e só, surgem, em razão de dolorosas medidas de privação de liberdade, mecanismos reactivos. Aqui, tão só, de relevante acompanhamento pessoal e de necessária solidariedade. Onde se evidencia, aqui, a solidariedade dos dois Sindicatos de Jogadores e, em particular, do português. A segunda nota para constatar que a intermediação contemporânea não pode ser entendida, tão só, como uma mera realidade económica - financeira. A intermediação deve assumir uma responsabilidade social e, logo, com efectivos mecanismos de acompanhamento. E estes são mais importantes quer em razão da especificidade de cada jogador - já que cada um de nós é um ser que não se repete - quer em razão do local de trabalho e da imamente inserção pessoal e profissional. Há clubes que acompanham o dia a dia dos seus jogadores - por vezes com exageros... - e há outros, porventura a grande maioria, que apenas se preocupam com o que se passa no âmbito do seu complexo desportivo ou do seu concreto espaço de exercício do contrato desportivo celebrado... Conheço uma situação de um grande jogador que só se salvou em razão de uma solidariedade bem efectiva. Já que a detenção estava ao virar da esquina... E era mesmo ao virar da esquina! E assim é bem diferente a solidão da companhia. É bem diferente a fatalidade da solidariedade ao Rúben Semedo tem de ultrapassar as palavras ou escritos de circunstância. Determina, na medida do possível, visitas à prisão, palavras de conforto, sinais de encorajamento. É que os «ausentes nunca têm razão»!

4. Permitam uma nota acerca de patrocínios. A Liga espanhola de futebol - La Liga - depois de ténis com Rafael Nadal, da patinagem no gelo e do badminton, chegou à Fórmula 1. Patrocina a Renault e, entre eles, o Carlos Sainz. E, assim, o logótipo da Liga estará nos dois bólides e, também, nos fatos dos dois pilotos da equipa. É um casamento global. Com a velocidade da Fórmula 1 e a visibilidade global de Real de Madrid e Barcelona!

5. O tribunal da Relação do Porto proibiu a divulgação electrónica do universo Benfica. Direi que foi feita justiça. E construída uma tese jurisprudencial acerca da correspondência privada. Direi que foi tardia a proibição. Já foram divulgados muitos. E mencionados muitos cidadãos. Muitos mesmos. Recordo, tão só, e por ora, o nosso Padre António Vieira: «A justiça está entre a piedade e a crueldade: o justo propende para a parte do piedoso; o justiceiro para a de cruel»!

6. Na quarta feira teremos a outra meia-final da Taça de Portugal. Aves e Caldas procuram, numa luta decerto renhida, a presença na final do futebol de todos. E no Estádio de todos. O Estádio Nacional!"

Fernando Seara, in A Bola

SEGUNDA PARTE À BENFICA


"Paços personalizado criou dificuldades a um Benfica que arriscou tudo para ser feliz.

Personalidade e critério
1. Primeiro parte muito boa do P. Ferreira, que com uma estrutura de 4x2x3x1, perante um Benfica em 4x3x3, esteve bem organizado defensivamente e saiu bem nas transições, criando dificuldades ao adversário. Numa dessas transições marcou e ficou mais confortável no jogo. A colocação de dois pivots, Gian e Assis, fez com que o Benfica sentisse dificuldades na zona de criação, sobretudo no corredor central, forçando os encarnados a explorar mais os flancos, onde sobressaíram Rafa e André Almeida. Ainda assim, um Paços com personalidade soube sair bem das situações de pressão.

Encarnados avassaladores
2. A 2.ª parte do Benfica foi avassaladora. Cervi libertou-se em campo e confundiu as marcações, sobretudo do Bruno Santos, que não conseguiu acompanhar o argentino. O Benfica intensificou a pressão e com a entrada de Jiménez passou a jogar em 4x2x4, uma vez que tanto Cervi como Rafa actuaram abertos na frente de ataque. Foi com toda a naturalidade que o Benfica chegou ao empate, perante um Paços que experimentou, nessa fase de domínio do adversário, mais dificuldades em sair para o ataque com o mesmo critério da 1.ª parte.

Seferovic, aposta feliz
3. Rui Vitória arriscou tudo. Compactou a equipa com uma defesa a três e lançou Seferovic para ter mais presença na área. Acabou por ser uma aposta feliz, pois o suíço não demorou a servir Jonas para o 1-2.

Um Jonas de eleição
4. Jonas é, de facto, um jogador de eleição. Meia oportunidade basta para o brasileiro definir bem um lance na área. Vitória justa do Benfica, talvez exagerada nos números tendo em conta as dificuldades que o Paços lhe criou.

Rafa a tempo de brilhar
5. Rafa foi contundente em todo o jogo. É importante um jogador com o seu talento ter uma sequência de boas exibições, porque reforça a sua confiança e os adeptos passam a olhar para ele de modo diferente. Há mais tolerância ao erro. Em Portugal, o Rafa é o jogador em condução com mais velocidade e acredito que vai muito a tempo de assinar uma grande temporada."

Nandinho, in A Bola

NEM DE RABO SENTADO O VAR É COMPETENTE


"Fui, sou e serei um defensor do VAR. Mas defendo ainda mais a formação, para que se possa melhorar a qualidade da arbitragem. Porque instituiu-se o VAR a mata-cavalos e a inaptidão verificada no terreno prolonga-se agora no estúdio. Em campo, um árbitro incompetente levou o jogo de Tondela até ao minuto 99 e alterou a verdade desportiva. Com o rabo sentado e até com o aquecimento ligado, um VAR incompetente validou, mal, o primeiro golo do FC Porto no Estoril – teriam acontecido os outros se esse não contasse? – e validou, mal de novo, o golo da vitória do Belenenses sobre o Feirense, com isso alterando também a verdade desportiva. Não foram lances claros? Pois não, mas se o VAR não os avalia bem, qual é a mais valia que traz ao futebol?
Ao cabo de muita roupa suja lavada no tanque da varanda para gáudio dos vizinhos, Luís Filipe Vieira e Jorge Jesus encerraram os processos judiciais em que se acusavam mutuamente – sim, era o Benfica, eu sei – apresentando como justificação a vontade de "preservação da imagem dos protagonistas". E foram precisos anos para que as pessoas tão inteligentes que os rodeiam chegassem à conclusão que se tratava, e volto a citar, de uma "escalada geradora de mais danos do que benefícios"? Como me disse um dia um advogado amigo: "Deus proteja os litigantes compulsivos e os paranóicos das indemnizações, que é com eles que eu sustento a família".
Terminados os Jogos Olímpicos de inverno, deles destaco duas proezas. Desde logo, as cinco (!) medalhas da fundista norueguesa Marit Bjørgen, que elevou para 15 o seu total e ultrapassou o anterior recordista de medalhas, o compatriota do biatlo, Ole EInar Bjørndalen. A seguir, precisamente, o regresso aos grandes resultados da ora mulher de Bjørndalen, a bielorrussa Darya Domracheva, que superou a quebra de forma provocada pela doença e pela maternidade. Ao ganhar o ouro com um brilhante último percurso na estafeta – mais a medalha de prata na "mass start" – Domracheva reassumiu a condição de melhor biatleta do Planeta. Mais dois momentos altos do desporto no meu vasto currículo de espectador!
Sereia não sou, mas sei que semana após semana faltará sempre um tema nesta crónica. Infelizmente já dei – pouco, é certo, e mesmo assim demasiado – para o peditório daquela guerra estúpida de que só resultam vencidos. Manter-me-ei, por isso, fiel ao pensamento de Kafka: "As sereias possuem uma arma ainda mais terrível do que o seu canto: o seu silêncio".
Na semana que findou, completei 15 anos consecutivos de escrita no Record, mais de dez como seu director. Havia colaborado também durante alguns meses com o jornal, mesmo no início do século, pelo que estarei já entre aqueles que por mais tempo aqui produziram prosa. Fica assim próxima a altura em que o virtuoso silêncio a que me referi atrás será total, com a devida autorização do director-geral editorial da Cofina e do director de Record. Porque por muito duro que isso seja, o povo tem razão: a vida são dois dias."

FUTEBOL: RAIZ E UTOPIA


"A revista “Raiz e Utopia – crítica e alternativas para uma civilização diferente”, iniciativa de José António Saraiva e de muitos dos maiores vultos da cultura nacional (editada entre 1977 a 1981) foi um dos marcos muito importantes para a mudança das mentalidades e para o crescimento civilizacional. Por isso, a memória, a inovação, a criatividade que se deve à Raiz e Utopia.
Sempre estabeleci ligação entre a revista e o futebol como expressão de viver a vida em comunidade. 
Hoje, o tempo é também de fracturas, de diferenças, de originalidade, de tecnologia e de capacidade de superação de equipas perante adversários que jogam nos extremos (seja de violência, de ignorância, de injustiça e de corrupção e prepotência) e de equipas que continuam a revelar a coragem da frontalidade, a capacidade de inclusão, a inteligência de pensar sem se resignar perante qualquer obstáculo. Liberdade como táctica vencedora, diversidade como estratégia e genialidade como drible invencível.
O futebol será sempre um espaço privilegiado para procurar entender, observar e talvez concluir sobre o estado do país e das mentalidades, como laboratório único onde as emoções, sentimentos, padrões culturais e arte se manifestam com as suas virtudes e contradições.
Mas também um património de amizade, de memórias, um universo paralelo que faz mover as galáxias.
Os sonhos nascem das jogadas conseguidas ou imaginadas naquele rectângulo especial onde tudo acontece, por talentos que vivem para sempre.
O envolvimento social, as marcas de cada época, as ideologias, a violência, as lideranças (por vezes ridículas) que não param de mistificar e de utilizar o futebol para objectivos e finalidades que lhes são adversos, são dificuldades acrescidas que os adeptos (amantes do futebol) vão conseguindo derrotar mantendo a simplicidade aparente de um jogo, de uma utopia de criança.
E quando a bola inicia o movimento tudo pode acontecer, inclusive vencer.
Raiz, o que temos; Utopia, o que tentaremos alcançar porque não impossível mas somente ainda não atingida.
Pensar futebol, o que temos e o que poderemos ter, o desafio que nunca nos abandona e sempre nos desafia: desportista nunca desiste e vive para superar obstáculos. O futebol atravessa uma fase única mas determinante. Há adversários cada vez mais poderosos. Sente-se uma mentalidade de oportunismo financeiro à escala global sem equacionar riscos e consequências – só curto prazo.
As contínuas mudanças de regras e competições revelam a ânsia de domínios que se pretendem impor, essencialmente para enriquecimentos instantâneos, por mais estranhos que possam parecer, bem como um aproveitamento da globalização que mais se assemelha a uma ficção monocromática. 
Eles andam por aí e têm “olhos e ouvidos” em todos os lugares. Dizem que há quem se venda!
Que há quem traia valores que sempre defendeu!
Inventam-se currículos, criam-se mitos e estruturam-se empórios com gabinetes de especialistas do usufruto alheio. Há mesmo quem se especializa na mentira, na adulteração de imagens, na criação de cenários de polémica e de ódios, e lança, com o ar mais cândido, falsidades que certamente lhes trazem benfeitorias desde que encomendadas por quem “pode”… até que deixe de o poder.
Num jogo de futebol, numa discussão política no Parlamento, na análise de um acontecimento ou decisão governativa, não temos todos o dever de primeiro reflectir no assunto, de pensar como nos for possível e de trocarmos ideias para um esclarecimento útil?
Pensar, porém, é exercício que alguns procuram impedir (Orwell demonstra-o de forma clara) talvez por ser um dos momentos mais sublimes do existir.
Criam-se cenários contraditórios, incendeiam-se ânimos, disfarçam-se estratégias e incompetências e há quem se apodere do alheio sistematicamente, quem destrua a confiança, quem crie divisões para assim continuar a alimentar, com subserviências inconcebíveis, desprestigiantes e intoleráveis, os vícios de alguns usurpadores (por vezes, as mesmas famílias há décadas sucessivas) que nunca tiveram a arte e o engenho de dominar uma bola, de a conduzir e de lhe aplicar um remate certeiro ao ângulo da baliza por mais imaginária que for.
Como gladiadores romanos, findo o prazo da capacidade física, da utilidade no espectáculo, abandonam-se memórias e pessoas ao esquecimento e à miséria.
Raiz e utopia. Futebol.
De facto, temos um futebol com jogadores brilhantes, treinadores competentes e selecções vencedoras.
E os planos de desenvolvimento, os projectos de futuro? Isso é outro universo.
Para jogar ou treinar é indispensável possuir um conjunto de “habilitações” específicas.
Mesmo os adeptos dominam memórias, episódios e patrimónios que enriquecem aplausos e que são indispensáveis para apoiar as suas equipas. Eles são essenciais ao jogo e dão-lhe a dimensão, a utopia única.
De alguns dirigentes é que não se pode dizer o mesmo. O movimento associativo é e será sempre uma manifestação de vitalidade e autonomia da cidadania.
Porém, há tendências unanimistas de poder, há estratégias para subir velozmente degraus hierárquicos, há ambições desmedidas que não têm raiz que as suporte.
A falta de rumo, de visão, de missão, mesmo com vitórias de conjuntura, trará sempre consequências prejudiciais.
Analisar os fluxos monetários, as enormes equipas de assessores, a interminável compra e venda de jogadores de qualidade discutível, as constantes alterações para fortalecer o futebol-negócio acima de tudo, as permanentes mudanças nas regras e nas competições, a utilização de novas tecnologias com desvios inqualificáveis, a colocação de “exércitos adversários e guardas pretorianas” em todos os cantos, a valorização da violência e do sectarismo para impedir que o pensamento funcione livremente, são alguns dos resultados de quem não conhece, não gosta nem sabe jogar ou ver futebol. O contraditório nunca pode estar fora-de-jogo.
Vestígios de raiz:
- Dirigentes e assembleias gerais polémicas não ajudam a fortalecer a imagem do futebol.
- Centrar a paixão do jogo nos jogadores e treinadores.
- Segurança nos estádios para adeptos.
- Menos polémicas desviantes.
- Tempo útil de jogo na Liga I: muito reduzido – como optimizar?
- Muitas simulações exageradas ou falsas, sem sanção – o crime compensa!
- Muita contestação de jogadores junto de árbitros numa proximidade física exagerada.
- Árbitros com necessidade de melhor formação e avaliação mais exigente.
- Pouca intensidade e reduzido ritmo competitivo.
- Modelo e dimensão da Liga.
- Contratações sem critério: exagero de novas contratações nas janelas de transferências.
- Instabilidade permanente das lideranças das equipas.
- Arbitragens de fraco nível e muito permissivas, com perda de tempo.
- Decisões de CD da FPF sem a coerência necessária.
- Distanciamento da FPF e da Liga às realidades concretas do nosso futebol, a todos os níveis.
- Da arbitragem de Manuel Mota – 100% (Estoril x SCP) à arbitragem do SCP X Feirense: um descalabro total do VAR – como é possível?
- Regime de empréstimos e limite de planteis.
- Dívida, como procurar resolver um problema terrivelmente asfixiante?
- Desperdício de tempo e de recursos com minudências e protagonismos estéreis.
- Venda de jovens jogadores/talentos para o estrangeiro, muito precocemente (por vezes prejudicando a sua evolução).
Vestígios de utopia:
- Obrigatório pensar e conhecer os sinais do tempo.
- Indispensável agir para encontrar soluções para superar dificuldades: pensar futebol sempre.
- Criar planos de apoio a clubes com metas definidas (em função de critérios de fair play e qualidade de formação de jogadores).
- Liga II + Campeonato Nacional sub-23, o que vem aí?
- Estratégia para atracção de mais público local a apoiar – segurança garantida.
- Plano nacional para optimizar a formação de jovens jogadores.
- Formação contínua de treinadores, gratuita (particularmente para treinadores de competições não profissionais) e com âmbito nacional.
- Criar condições de formação de excelência para árbitros e condições de protecção e autonomia.
- Atitude dos dirigentes em defesa do futebol com regras precisas que limitem “habilidades” destrutivas.
- Falta de apoios para desenvolver o futebol em geral e não se limitar a apoiar sócios de classe da FPF com reforços sistemáticos de verbas, que parecem prémios de fidelidade e de silêncio.
- Economicamente, a FPF é um fantástico case study – falta maior transparência também nos critérios de distribuição de verbas e planos para potenciar a qualidade do nosso futebol.
- Títulos europeus são momentos importantes que alcançam dimensão futura quando se repercutem no desenvolvimento do sistema desportivo e na qualificação de dirigentes – se assim não for só serão mais uma data no calendário, embora sempre importante.
- Vencer é importante, mas estar sempre no grupo dos que podem vencer muitas vezes é muito mais importante.
- Para estar no desporto é indispensável trabalhar para encontrar soluções para os desafios que se colocam e manter uma cultura de valorização do que é nosso.
A imparável evolução tecnológica, os avanços da investigação científica, a possibilidade de criação de superatletas em laboratório, de interferir no ADN, a decisão de escolha de modalidade por critérios científicos, a capacidade em reduzir lesões por processos de manipulação científica, os novos jogos virtuais, podem ser possibilidades importantes, mas em jogos e actividades novas.
O futebol, património da Humanidade, evolui naturalmente (equipamentos mais leves e seguros) mas será sempre o jogo sedutor em que atletas dominam uma bola, com paixão, driblam com eficácia, libertam emoções em passes certeiros e potenciam sentimentos em golos únicos e inesquecíveis. Defender o futebol, como jogo onde os tempos se fundem e a humanidade se reencontra, é raiz que procurarei alimentar sempre com cuidado e desvelo.
Quanto aos novos jogos, que tenham o seu percurso, que cresçam e mantenham condições de inclusão e de sociabilidade…
Mas futebol é outro mundo: é outra dimensão! É sempre uma utopia a perseguir."

CHAMA IMENSA - BENFICA TV - 26 FEVEREIRO 2018 HD

                                           

AS REGRAS DOS JOGOS BENFICA TV HD :: 26 FEVEREIRO 2018

                                           

ANTÓNIO - PEDRO VASCONCELOS: UM DISCURSO SOBRE A LIBERDADE


" “Com a idade de 15 ou 16 anos, experimentei uma sensação de estranheza quando, ouvindo o relato do que se discutia, no Tribunal de Nuremberga, escutei os advogados de acusação e de defesa dando maior realce aos aspectos jurídicos dos crimes horrendos do nazismo do que aos seus aspectos psicológicos, sociológicos, éticos, políticos, ou seja, aos seus aspectos mais fundamente humanos”. Este é um texto de Jurgen Habermas (ainda felizmente vivo, com 88 anos de idade) que assim continua: “Como foi possível que numa cultura que integrou Hegel e Marx, dois autores onde o tema da realização concreta da liberdade adquire tamanha importância, tenham nascido o Hitler e os nazis? Como foi possível que os alemães não se tenham levantado, como onda gigante, contra esta monstruosa patologia social?”. E, a partir daquele momento, Habermas concluiu que a Razão, a Liberdade, a Justiça não poderiam estudar-se, unicamente, como questões teóricas, porque eram principalmente questões social e politicamente práticas. No seu livro Conhecimento e Interesse, Habermas distingue três interesses cognitivos: o técnico, o prático e o emancipatório: “O acesso às ciências analítico-empíricas incorpora um interesse cognitivo técnico; o acesso às ciências hermenêutico-históricas incorpora um interesse prático; e o acesso às ciências criticamente orientadas incorpora um interesse cognitivo emancipatório”. São demasiado evidentes, em Habermas, os significados de “técnico”, nas ciências analítico-empíricas, e de “prático”, nas ciências histórico-hermenêuticas (para muitos, ciências sociais e humanas). Mas… as ciências críticas? São aquelas que não dispensam a autorreflexão, como a psicanálise, em Freud, e o materialismo, em Marx, visando um objectivo emancipatório – autorreflexão que pretende libertar o sujeito do jugo dos poderes hipostasiados. E que portanto pretende ser reflexão, mediação, transformação.
Venho de ler dois livros do cineasta (e ainda escritor e intelectual e conhecido benfiquista) António-Pedro de Vasconcelos, O Futuro da Ficção e Um cineasta condenado a ser livre. Neles e no diálogo de amigos que vamos mantendo, assoma sempre o itinerário pensante do António-Pedro, não como os que memorizam, com unção e reverência, o saber alheio, para o repetir acriticamente, mas como os que fazem do saber alheio um interlocutor indispensável na demanda das questões que se procuram. É um homem de esquerda, salientando portanto o papel inapagável de Karl Marx, na história da humanidade, principalmente o seu humanismo - um humanismo real e não só um humanismo retórico, filantropicamente encomiástico, caridoso nas palavras, indiferente nas ações. Poderemos citar, a propósito, um dos grandes marxólogos do nosso tempo, José Barata-Moura: “O humanismo de Marx não é a celebração oratória de uma humanidade idealizada, para pequenos efeitos burgueses de gestão compensatória das abençoada ordem capitalista de exploração; do mesmo passo que também o seu comunismo não representa qualquer incarnação apoteótica de verdade eternas de recorte moralista, nem qualquer triunfo utópico de devaneios profético-organizativos, congeminados até ao pormenor por exuberantes e bem intencionados melhoradores do mundo” (Materialismo e Subjectividade, Avante, Lisboa, 1997, pp. 151/152). Também, em António-Pedro Vasconcelos não se descobrem, nas suas palavras, “verdades eternas”, porque o seu humanismo significa devolver ao homem todo e a todos os homens o que ao homem pertence, a sua humanidade, lutando sempre contra as condições adversas que a dialética da história lhe apresente.
Palavras sábias estas que o António-Pedro faz suas: porque é um ser humano e ainda porque é um artista e, como tal, um homem constitutivamente livre e libertador. É ele a dizê-lo, com uma nitidez que não admite dúvidas: “Para mim, a liberdade é um valor inalienável e é o valor supremo. É a base da relação que tenho comigo e com os outros, com o mundo e com o futuro. Em última análise, eu sou responsável por aquilo que me acontece. E isso, para mim, afastou o problema de Deus, mesmo que eu pense, como o Orson Welles, que nós temos de acreditar em qualquer coisa de superior” (António-Pedro Vasconcelos: um cineasta condenado a ser livre, diálogo com José Jorge Letria, Guerra & Paz, Lisboa, 2016, pp. 61/62). Num livro admirável, uma síntese magistral da história da arte, na cultura ocidental, António-Pedro manifesta-se radicalmente livre. Radicalmente? Sim, porque ser radical (e relembro Marx, como o António-Pedro o faz tantas vezes): “ser radical é tomar as coisas pela raiz”. Só que, “para o homem, a raiz é o próprio homem”, ou seja, o horizonte, onde o homem se projecta, é autenticamente humano. Desde os geniais artistas florentinos até a Holywood a história da arte pode resumir-se numa “longa luta em que os grandes criadores se batem pelo reconhecimento do seu estatuto e procuram libertar-se da autoridade dos Papas, dos mecenas e dos poderosos. Miguel Ângelo, enfrentando a autoridade de Júlio II, ao pintar, como quis, O Juízo Final; Ticiano, a quem Carlos V, o homem mais poderoso do Universo, apanhou do chão o pincel que ele deixara cair, impondo-se naturalmente pelo reconhecimento do seu génio”. E continua, avocando outros nomes, outros artistas: “Griffith, que inventou o cinema, com O Nascimento de uma Nação, reclamava para a 7º arte a mesma liberdade que tiveram os autores da Bíblia e Shakespeare (António-Pedro Vasconcelos, O Futuro da Ficção, Fundação Francisco Manuel dos Santos, Lisboa, 2012, p. 52). No cineasta António-Pedro Vasconcelos, é a liberdade que melhor assume o espaço ontológico do humano, do verdadeiro humanismo. Sem liberdade, a humanidade não acontece…
Os meus almoços quinzenais com o António-Pedro extravasam facilmente dos planos do cinema ou do desporto, em direcção a outras incursões teóricas, sem desconhecermos, tanto ele como eu, que a práxis, enquanto acção política, concita um maior interesse. É conhecida a sentença de Marx: “O indivíduo é o conjunto das relações sociais”. Um cristão-católico, Saint-Exupéry, diz quase o mesmo: “O homem não é mais do que um nó de relações, são as relações o que mais conta, para o homem”. Gramsci afirmou, sem titubear: “O homem é um processo, é precisamente o processo dos seus actos”. De facto, cada um de nós é aquilo que faz. E eu quero fazer-me, fazendo bons amigos. O que é um “bom amigo”? Para mim, é o que tem sede de uma sólida amizade. Há duas semanas, o Doutor José Tolentino Mendonça, vice-reitor da Universidade Católica Portuguesa, foi convidado, pelo Papa Francisco, a pregar-lhe um retiro espiritual. E começou assim a primeira das suas prédicas, todas elas com a presença do Papa, que é um leitor fiel dos livros do Padre José Tolentino Mendonça: “Há muita sede, no coração dos homens”. E disse ainda: “É urgente redescobrir a bem-aventurança da sede. A pior coisa para um crente é estar saciado de Deus. Pelo contrário, felizes os que têm fome e sede de Deus”. A propósito, aconselho a leitura do último livro, de José Tolentino Mendonça, O Pequeno Caminho Das Grandes Perguntas. Nele, encontrei o seguinte: “A teologia da ternura tem sido uma das grandes insistências do Papa Francisco” (p. 113). O meu Amigo António-Pedro Vasconcelos insiste… que não tem fé. E acrescenta, com um rasgo rápido, perspicaz e dramático: “Mas a gente só sabe quem foi, depois de morto”. Mas, tendo ou não tendo fé em Deus, António-Pedro Vasconcelos, o intelectual, o cineasta, o benfiquista, o incansável peregrino do Bom e do Belo, no espaço oceânico da vida, é de uma ternura donde ressalta uma permanente afirmação da dignidade humana e uma indignada recusa de tudo o que possa ser redutor dela.
Por isso, acima do mais, somos amigos…"